Cem Anos

terça-feira, setembro 19, 2006

O banal (III)

Vim à janela e olhei a imensidão dos prados… não reparei nos prados, fixei-me na imensidão… e absorvi-a. Voltei-me e deparei com a escuridão da sala… não me apercebi da escuridão, concentrei-me na sala… e integrei-me.

Olhaste-me, fria. Deveria estar desenquadrado pois levantaste-te e gentil mas decididamente arrastaste-me para junto do sofá. Deste dois passos atrás, estudaste o efeito, a luz, o enquadramento, e parecendo agradada com o resultado final, foste sentar-te novamente no cadeirão de braços.

Reparei na lenha que crepitava na lareira, mas não me lembro se daí vinha algum calor. Vinha sim um silvo constante, perturbador, persistente… mas tu estavas embrenhada no teu livro. Tentei controlar a minha respiração.



Houve tempos em que te embrenhavas em mim. Tempos em que eu ia até à janela, observava os prados e emprestava-lhes imensidão. Em que me voltava para iluminar a sala. Em que me olhavas, desejosa. Em que eu me destacava da mobília, do papel de parede, da decoração. Tempos em que o calor vinha de nós e em que tu silvavas, sequiosa…

Porém, um dia voltei-me e a sala permaneceu na penumbra… e entreguei-me.

1 Comentários:

  • Difícil a indiferença, quando se faz parte da mobília e se apercebe que, ao olhar do outro já tudo é normal, tudo é cenário, quando a monotonia se instala e o encantamento acabou, quando nos tornamos banais.

    By Blogger Cecilia M, at 9:03 da manhã  

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