Cem Anos

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Porquê?

Não conseguia perceber porquê. Dava voltas e mais voltas à cabeça, mas definitivamente não conseguia perceber porquê. Porque a odiava? Não sabia, não sabia...

Em tempos tinha-a amado. Não há muito tempo. Lembrava-se de há apenas umas semanas atrás sentir o seu coração em pleno alvoroço só pela mera menção do seu nome. Lembrava-se de, há bem poucos dias, a ter olhado nos seus doces olhos verdes e lhe ter declarado o seu amor eterno. Lembrava-se de lhe ter telefonado a meio do dia, há coisa de um mês atrás, só para lhe dizer que era ela a mulher da sua vida.

Então como é que de repente passara a odiá-la? A desprezá-la? A repugnar-lhe que ela lhe tocasse, a irritar-se sempre que ela lhe fazia uma carícia, a fugir sempre que ela lhe tentava dar um beijo, a zangar-se sempre que ela lhe dizia coisas ternurentas? Como? Como? Como é que alguém que ele achava ser a essência da sua vida se tinha transformado, em tão poucos dias, num fardo demasiado pesado para ser carregado por mais tempo? Não compreendia, não conseguia perceber porquê...

Ela continuava a amá-lo, seguramente. É certo que nos últimos tempos tratava-o com um certo ressentimento, uma certa amargura, uma certa impaciência. Tudo provocado pela atitude dele para com ela. A princípio, ela achou que seria uma fase, talvez provocada por problemas no trabalho. E ele irritava-se ainda mais por ela responder com ternura à sua agressividade, ao seu desprezo. Depois, a partir de determinada altura, ela começou a impacientar-se, começou a reagir bruscamente à sua frieza, ao seu desdém. E ele redobrou de irritação. As discussões sucediam-se, os desentendimentos, os amuos mútuos. A relação estava a degradar-se. Seria isto que ele realmente pretendia desde o princípio? Obrigá-la a detestá-lo? Obrigá-la a contribuir para o desmoronamento da relação evitando ficar com o ónus exclusivo da culpa?

E eles tinham sido tão felizes. E ele tinha sido tão feliz. Há bem poucos dias atrás. De repente, algo mudara. Começou a questionar-se, a questionar a relação. Seria mesmo feliz? A sua relação não o estaria a sufocar, a cercear a sua liberdade? Não lhe apetecia agora, passados os primeiros momentos de paixão, experimentar novas sensações, ensaiar novos voos? E esta relação que, subitamente, lhe parecia mais um lastro que lhe pesava do que uma raiz donde se alimentasse... talvez fosse tempo de sair, aproveitando as fricções recentes. Convenceu-se de que os atritos eram um reflexo da degradação da relação, embora soubesse interiormente que eram causados por si.

E acabou. Aproveitou uma discussão mais acesa, um desentendimento mais marcado e acabou com a relação. Sentiu imediatamente uma sensação de alívio. Uma sensação de liberdade. Sentiu-se mais leve, mais descansado. Convenceu-se, por uns dias, de que esta era a prova que faltava para demonstrar que realmente já não sentia nada por ela. Tinha-lhe sido tão fácil acabar: não ficara triste, não chorara, não tinha sentido qualquer amargura.

Mas agora... agora... Já há alguns dias que rebobinava mentalmente toda a sua relação com ela. E sentia que raramente havia sido tão feliz durante tanto tempo... e que o único pecado dela tinha sido amá-lo sem condições e sem folgas, inteiramente. Plenamente. Tinha-o amado a ele, tal como ele era, com todos os seus defeitos, as suas virtudes e as suas dúvidas. E ele não tinha conseguido responder-lhe à altura. Por isso reagiu tão amargamente. Por isso começou a impacientar-se com ela, com a sua dedicação, com a sua lealdade, com o seu amor sempre presente. Por isso sentiu necessidade de espaço, necessidade de respirar, necessidade de se sentir imperfeito. Por isso a começou a odiar.

Por isso sentiu-se aliviado quando se separou dela. Só que agora, passado este tempo, sente saudades dos momentos de felicidade. Dos momentos de partilha. Dos momentos de companheirismo. Dos momentos de amizade. Dos momentos... com ela. Agora, passado este tempo, sente saudades dela. O ódio deu lugar à ternura. Ao amor, novamente? Ou o amor sempre estivera lá?

Não conseguia perceber porquê. Dava voltas e mais voltas à cabeça, mas definitivamente não conseguia perceber porquê. Porque a amava? Não sabia, não sabia...

terça-feira, fevereiro 21, 2006

É isto para sempre

Na lápide fria varrida pela chuva
Escrevi com o dedo
Escrevi com a cera:
É isto para sempre.
Enterrei-te no meu coração
Pois nada lá pode existir com vida
Pois nada lá pode existir
Lágrima.
O cipreste como minha testemunha
Disse com a minha alma
Disse com a sua seiva
Aqui jaz o amor
O ódio
A loucura
A ternura
Aqui jaz o presente
Para que o futuro seja da saudade do passado.
Puxei pela manga de um anjo que velava
E segredei-lhe ao ouvido
E segredei-lhe aos caracóis
O azul do céu pode ser teu
Mas o azul do mar será sempre nosso
E até as tuas nuvens se lhe rendem
Alimentando-o.
Levantei os olhos para o crucifixo
Que ornamentava o nosso derradeiro leito
E pensei
E sonhei
O que é uma vez divino
É-o sempre
E só é realmente divino o amor
Meu amor.
Atirei um punhado de terra para cima de mim
E voltei-te as costas
E voltei a ti
Para me abraçar ao teu perfume
E dançar o tango da solidão
Ao som das minhas lágrimas
Saudades nossas.
Enquanto o teu espectro se alcandorava às alturas
Lembrei-me que também nós fomos construtores do divino
Cítara de anjos
Raios de lua
Orvalho da manhã
Orvalho da esperança.

Olhei-te
Uma lágrima molhou-me a testa
Uma lágrima fugiu-me.
Chove.
É isto para sempre.

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Como lhe havia prometido

Fui ter contigo. As minhas expectativas não eram elevadas, mas estava naturalmente curioso: como serias, rir-te-ias como ela, serias mais bonita, serias tão divertida?

Vi-te e não eras tão bonita como ela. Não tinhas o seu sorriso, não tinhas o seu charme natural. Começámos a falar e pareceste-me divertida, simpática. Infelizmente, não eras tão divertida nem tão simpática (nem tão querida) como ela.

Comecei desde logo a pensar numa forma de me escapar, de dizer que tinha sido um engano, de inventar uma desculpa para sair dali. Eu sabia que a culpa não era tua, o problema era meu, exclusivamente meu. Comecei a ficar cada vez mais desconfortável, não aguentava ter de continuar com aquela pequena farsa. Tu falavas e eu ia acenando, sorrindo aqui e ali, dizendo qualquer coisa em concordância. Mas a pensar, sempre a pensar, isto foi um erro, não deveria ter vindo, quero ir-me embora.

Julgo que acabaste por te aperceber do meu desconforto. Presumo que também tenhas ficado desconfortável, mas era difícil encontrar uma saída airosa para a situação. Tínhamos combinado encontrar-nos para lanchar, talvez irmos ao cinema de seguida. Ainda não tínhamos começado a lanchar e já estávamos os dois desconfortáveis, mas o que fazer? Inventar uma desculpa? Arranjar um pretexto para sair? Sim, mas qual?

Não tive pena por ti; tu pareceste-me uma pessoa independente, de personalidade marcada e bastante agradável. Sabia que algo de bom te estaria reservado. E sabia que eu não era isso.

Tive pena por mim. Continuava cativo dela.

Para sempre dela (como lhe havia prometido).

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

How Can You Mend A Broken Heart? (Bee Gees)

Para ti nós são laços quebrados
Mas para mim nós ainda fazemos sentido.

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Quero tanto

Que sou eu? Quem sou eu? Que faço? Porque faço?
Só, tão só
Mau, tão mau...
Porquê? Podia ser melhor? Podia ser feliz?
Podia, podia e não consigo...
Tento ou se calhar já nem tento
Que importa?
Mas quero, quero muito
Ou às vezes quero muito
E não consigo, e não consigo...
Ser melhor, ser maior, ser brilhante
Ser, quero ser, não quero diluir-me em banalidades
Infidelidades, compromissos, cedências nojentas
Porcas, nojentas, porcas...
Quero ter coragem, quero querer
Não sei o que quero mas quero
Às vezes quero, outras vezes já nem sei
Mas quero, quero muito
Quero saber porquê?
O que me falta?
Falta-me um pedacinho tão grande
Falta-me eu, um bocadinho enorme
Falta-me uma asa, uma cauda, uma alma.
Porquê?
Julgo-me importante mas nada
Sou nada, isso é o que eu sou
Importante para mim e rio-me
Rio-me porque julgo que sofro
Estúpido egocêntrico!
Sofro porque me rio, de mim
E às vezes choro, imploro
Tempos melhores, melhores sortes
Outros amores
Outros amores
Novas dores,
Inevitável?

Porque me conheço?
Porque me sei?
Sei-me oco, sei-me ridículo.
Se ao menos não soubesse
Se ao menos fosse avestruz
Fosse galinha, fosse camaleão
Fosse doutro tempo e doutro lugar
Fosse de onde não se sabe o que se é
Fosse eu outro
Então talvez fosse eu.
Que estupidez, que desperdício
Que suplício
Dor-amor
Não faz sentido,
Mas para mim faz
Só para mim faz
Que conheço eu, que sei eu?
Para além das minhas fronteiras
Sou toupeira, sou morcego
Não sou.
Continuar porque sim?
E tenho escolha, não tenho escolha
Vivo porque que mais se há-de fazer?
E gosto de viver, gosto do mar
Gosto do sol, gosto de alguns olhos
De algumas melodias
Gosto de algumas almas.
Pena estar sufocado, pena não me lembrar
Não me lembrar do sal de um beijo
Pena não me lembrar do sol de um sorriso
Pena estar asfixiado, pena custar-me respirar
Mas que pena!
Tenho tanta pena minha que rebento em gargalhadas
Que pobrezinho sou, que coitadinho!
Apetece-me bater-me sempre que cedo
Sempre que desisto.
Desfazer-me em pancada para não me desfazer em sal
Destroçar-me
Destroçar-me, agora por fora
Desconstruir-me, agora por fora
Desfazer-me, agora e para sempre
Por fora, por dentro.

Sonho com outro eu mas impossível
Dizem-me impossível
Sei-me outro impossível.
Então, numa noite escura de desespero
Fria
Numa noite fria de desespero
Encontrei-me com uma imagem minha
E quis ser eu
Quis ser eu ali, naquela imagem
Naquela noite
Escura
Quis ser
Por isso sou
Estou
Pudesse eu não ser
Mas que fazer?
Queria tanto ter outra oportunidade
Às vezes queria tanto
Voltar atrás
Voar atrás, viver para trás
Para voltar e ser eu
Aquele que eu quero ser e não aquele que eu sou
Para voltar e ser eu
Brilhar, brilhante
Tão completo, com tanto sentido
Sem dor-amor
Comigo
Queria tanto
Às vezes queria tanto

domingo, fevereiro 12, 2006

Senti-me feliz, momentaneamente feliz

Acordei cedo e fui até à marginal. Apetecia-me ar, apetecia-me o mar. O dia não estava com boa cara: nublado, frio, a ameaçar chuva a qualquer momento. Mas agasalhei-me bem, meti-me no carro e cheguei rapidamente. Era muito cedo, andava pouca gente na rua, não havia trânsito e foi fácil arranjar estacionamento.

Comecei a andar lenta, vagarosamente, fui andando ao longo do passeio, paralelamente à praia, embora me apetecesse fazer como as gaivotas e andar em círculos. O cheiro da maresia era apenas pressentido, vindo na aragem fria que me enregelava o cérebro. Tentei agasalhar-me melhor, estreitei o cachecol ainda mais à volta da cara, abotoei o casaco.

Sempre me fascinou o mar. É tanto. Muitas vezes, é tudo. Hoje era um desses dias. Não resisti, entrei na praia, descalcei-me, senti a areia nos pés e pensei como era bom sentir a areia nos pés. Fui em direcção ao mar. Era um chamamento, não consegui resistir, o mar atrai-me como um magneto atrai o ferro. As gaivotas estavam hoje particularmente activas. Será que havia peixe ali por perto? Não sei, sei só que andavam muitas, muitíssimas gaivotas em suaves bailados, ora subindo ora descendo, ora para a esquerda ora para a direita, e também essa dança me parecia encantatória, hipnótica.

Já bem perto da água, era agora o cheiro da maresia que se me impunha, enchia-me os pulmões de ar fresco e alimentava-me o âmago. Senti que realmente me poderia alimentar deste ar fresco de sal, de mar, de vida. Inalei o mais que pude e senti-me feliz, momentaneamente feliz.

Neste estado de quase transe, pus-me a escutar. Não havia muito para ouvir, o tempo frio afastava as pessoas e a praia estava praticamente deserta. O piar das gaivotas, sim, o piar das gaivotas ia cortando o silêncio; também o barulho de um ou outro carro, ao longe, era perceptível; mas havia um barulho mais forte, mais sereno, mais suave: a melodia doce das ondas que se espraiavam na areia.

Puxei as calças e fui molhar os pés. A água estava fria, muito fria, e soube-me tão bem sentir a água fria nos pés. Fiquei à espera da próxima onda, fiquei à espera de que me voltasse a molhar, e depois da próxima e da próxima e da próxima... Aproveitei para molhar também as mãos e levei um pouquinho de água aos lábios. Ah, o sal... E senti-me feliz, momentaneamente feliz.

Abri os braços, respirei fundo, olhei para o mar lá longe e senti-me crescer. Senti que algures cá dentro houve uma flor que se abriu para o sol. Senti uma luz que se acendeu. Senti uma fogueira que se ateou. Senti-me mais alto, mais forte, mais importante. Nesse momento, um raio de sol conseguiu atravessar as nuvens e foi iluminar a prata do mar, fazendo-o faiscar. Percorreu o seu caminho ao longo da imensidão do oceano e chegou até mim, iluminando o meu estanho, fazendo-me cintilar. Estava resplandecente, achei que deveria estar resplendoroso, cheguei a temer encandear os carros que passavam lá em cima na rua.

Comecei a correr ao longo da praia, o vento frio a alimentar-me o diafragma, a água a baptizar-me ciclicamente, o sol a aquecer-me as costas. Corri, corri, corri... sentia que se corresse o suficiente poderia dar um salto no tempo, poderia avançar, queimar etapas, deixar o antigo eu para trás, abraçar-me lá à frente, ao meu novo eu. Portanto corri, corri, corri... e sentia-me feliz, momentaneamente feliz.

O raio de sol foi abafado pelas nuvens e eu cansei-me. Os pés doíam-me, estavam gelados e também arranhados pela areia grossa. Havia mais carros na rua, fazendo barulho, e algumas pessoas passeavam pela marginal olhando para mim, perplexas. As gaivotas voaram para longe, o mar alterou-se, ficando mais hostil, e começou a chover. Sentei-me cansado, mesmo muito cansado. Senti-me cansado, mesmo muito cansado. Ainda a arfar, lamentei não ter conseguido dar um salto no tempo e amaldiçoei o meu eu que me agarrou, sugou, impediu de voar. Ao longe, ainda bem longe, vi o meu novo eu que voava junto com as gaivotas, brincava em círculos, dançava aleatoriamente, investia na vertical, planava para descansar.

E senti-me infeliz, eternamente infeliz...

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Pelos teus olhos

Eu amava o mundo
porque o via pelos teus olhos

Agora que eles se me fecharam
o mundo voltou a ser cinzento
Melancólico
Cinzento

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Desisto

Hoje pensei que seria talvez melhor fugir. Não sei, não sei porquê, não sei para onde, mas fugir, fugir, fugir... Não consigo mais encontrar-me, ver-me, confrontar-me, não aguento mais, não posso mais, pensei. Vou fugir.

Depois... depois desisti, claro. Como de costume. Como sempre. Mas temo que não aguente mais. Queria poder demitir-me, exilar-me, ostracizar-me. Como dantes, desisti.

É por isso que quero fugir: não aguento mais desistir. Desisto! Não posso mais aturar a minha incapacidade. De ser, de viver, de tentar. Talvez começar de novo?... Não, seria penoso. Demasiado penoso. Seria demasiado.

Irrito-me comigo na mesma proporção em que me idolatro. Os outros, ah, os outros, não percebem nada, não vêem nada, nada nada. Nada. Eu, eu, sim, eu, só eu, eu sei! Eu sei e preferia não ser, perdão, não saber, preferia a inconsciência. Preferiria? Não sei. E irrito-me por não ser, quero dizer, por não saber. Quem não sabe é como quem não é. E quem é, sabe. E eu não sei nada. E os outros não sabem nada. Nada nada.

E, não obstante, gosto de mim. Por vezes. Quase sempre. Não agora, claro, porque agora detesto-me, odeio-me. Acho que me detesto desde que me conheço. Desde sempre? Não sou.

Se ao menos me compreendessem... Me compreendessem e me traduzissem e me explicassem e me iniciassem. Podia então ser porquê. Queria dizer, saber porquê. Acho que sim, que queria dizer... Quer dizer, eu normalmente não sou muito. Já o tinha dito. Aliás, não sou nada.

Afinal, não. Afinal, o que tinha dito é que era muito, ou melhor, sabia muito. Demasiado. E que queria não ser. Ou não saber, é o mesmo. Preferia a não existência, diga-se, a ignorância. Não, o desconhecimento. Preferia o desconhecimento. Por que o disse, não sou. Não me compreendo. Não importa! Prefiro o desconhecimento. A des-existência. Minha velha conhecida. A desistência.

Mas a desistência, tenho-a. Sou-a. Agora a des-existência, eu que existo tanto? Eu que me imponho tanto, todos os dias, tão agressivamente, a mim? E, porém, não existo. Porque os outros, ah, os outros... Fossem eles inteligentes, ao menos. Persistem apenas em ser e contentam-se em ser e regozijam-se por serem e são. E impõem-se-me. E eu não se me lhes imponho. Persisto e contento-me e regozijo-me com a minha auto-imposição. Que me dói...

Por isso, numa palavra, desisto! Não, em três palavras di-lo-ei melhor: fugir, fugir, fugir! Mas para onde, se me encontro?... Encontro-me? Suprema ironia! Encontrar-me pudesse eu, esquecer-me pudesse eu... Pudesse eu. Que não posso. Já não posso. Não sei se alguma vez pude. Não sou, não sou nada. Ou sou tudo e quem sabe tudo, não sabe nada. Gostava de conseguir explicá-lo. Gostava de conseguir. Mas forças já não tenho, alguma vez tive? Desconheço. Já o tinha dito. Não sou.

Porque sou muito. Porque sou demasiado, sei demasiado. E se fosse só eu, ao menos. Eu comigo. Um universo feito de mim. De mim comigo. De mim para mim. Se assim fosse, ao menos. Mas tudo tinha de ser feito ao mais, aos outros! Ah, os outros... Como me ferem! Menos do que eu a mim, bem entendido. Mas ainda assim, muito. Demasiado. Penoso.

Des-existo!